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20 de fevereiro de 2011

A JORNADA - Conto

Antes de postá-lo gostaria de explicar umas coisinhas sobre ele nessa minha volta ao mundo bloguero.

Comecei a pensar no conto depois de conhecer duas pessoas muito especiais que vieram tornar-se amigas muito importantes na minha vida. Elas são mãe e filha.

Bom, a idéia original veio porque a estória da mãe foi algo que chamou muito minha atenção pela coragem que ela teve.  Basicamente, e sem querer expor as intimidades dos meus amigos, digo que ela (a mãe) foi abandonada por uma pessoa muito especial e importante em sua vida, fato que acabou revirando sua vida completamente.

É verdade, que essas mudanças, no final, não foram ruins... O trajeto até estabilizar as coisas, sim, foi duro e chocante, porque era algo que ela deveria fazer sozinha.

Foi aí que eu centrei a estória... Na verdade não há nenhuma árvore e lugar sombrio... Só há ela diante de seus medos e decepções. Algo tipo "eu contra mim".

No áudio todas as vozes masculinas são minhas e as femininas são da filha dela.

Ressalto que eu sou um completo leigo em edições e vocês vão poder comprobar isso à seguir. Entretanto a intenção era homenagear uma história real de coragem com final feliz de uma pessoa que eu adoro.

Há muita metáfora no conto e sei que será difícil entender tudo... Mas faça-o como se tratasse de algo pessoal e tenho certeza que vocês gostarão dele!


Sobre reviravoltas, coragem, família e nosso eu interior…




Clique no play e leia o conto junto ao áudio

 


***

Ato I – A Jornada

Livro Perdido de Eddatrecho retirado como reprodução

Carta dos Desafios Tomo XXVII, verso 7

sustentando-se de pé durante duas luas cheias

E sem permitir que a paisagem que lhe rodeia, és dizer, toda ambientação

Derrube sua alma e coração, pois certamente ali encontrarás

Tudo que seu ébrio espírito traz...

***

Chovia. O céu era escuro, cinza e repleto de nuvens carregadas do poder da natureza.O bosque ao redor dela estava totalmente destruído. As plantas, flores e, praticamente, todas os seres vivos da floresta haviam sido destroçados... Menos um.

Depois de cruzar por entre abismos e desfiladeiros, enfrentar naufrágios e tormentas, aquele era o momento mais crucial e solitário que ela teve. E também o mais decisivo de cara ao futuro imediato que esperava-lhe.

Diante daquela triste vista, a dor que batia mais forte não eram das imagens do bio-extermínio que estavam em torno dela, e sim, da incompreensão alheia por culpa do abandono que havia sofrido pelo seu querido cavalo alado. Mas ainda assim aquela vista continuava a ser arrepiante e sombria. Era como se todo o sentimento de solidão e recusa, mais íntimo que tinha, houvesse sido colocado em sua frente para que o enfrentara em sua jornada até chegar a Yggdrasill, a famosa Árvore-do-Conhecimento.

Ato II – O Encontro

Foi imersa em esse panorama de desespero que ela reconheceu seu objetivo... Yggdrasill, a famosa Árvore era enorme e assustadora. Eram poucos os guerreiros que chegavam até ali e conseguiam fazer-la responder seus desejos ou perguntas.

De pé, a menina-guerreira recordou os versos do livro dos Desafios, onde estipula as regras para comunicar-se com a descomunal Planta sem que o forasteiro fora atacado pelas temidas Walkírias.

Diz a lenda que em Yggdrasill estão as respostas para as grandes perguntas da humanidade. Por esse motivo ela sempre é guardada por uma centúria de Walkírias, e somente os deuses podem visitá-la sem respeitar as penitências ou regras estabelecidas.


Ato III – O Diálogo

Duas luas cheias em pé... não posso fraquejar agora...” - Pensava ela enquanto baixava os olhos e via como sua roupa estava já desbotada e maltrapilha pela viagem. Neste momento sentiu cansaço pelo esforço e por todas as coisas que escutou e aguentou durante este período. Quase não restava água em seu alforge e apenas tinha pão para alimentar-se... seu machado estava oxidando... Entretanto ela seguia de pé, e assim manteve-se durante o tempo fixado, até que, já segura que era o momento exato disse com voz alta e firme:

"Sou Tahnya, filha da Terra e do Céu, treinada nas artes da batalha pelos guerreiros Vida e Perseverança... Durante minha jornada vivente, fui abandonada por meu cavalo alado, Pégasus, e desde então, falo uma língua que nenhum ser vivo pode compreender... Nem sequer meus entes queridos entendem minhas palavras ou acreditam no que pronuncio e profetizo..."

Yggdrasill, apesar de seu vasto conhecimento e experiência, nunca havia estado diante de uma menina-guerreira. Então sacudindo suas raízes da terra e balançando suas folhas de maneira assustadora em sua direção, a Árvore diz:

"Sou Yggdrasill. Minhas raízes estão situadas em Niflheim e meu tronco mais alto, que pode inclusive tocar o Sol e a Lua, chegam até Asgard, a cidade dourada e terra dos deuses. Sou dona do conhecimento do mundo e posso oferecer-lhe alguns deles a troco de um ato de abnegação, já que demonstraste coragem perante mim... Por que viestes pequena?

A menina levanta os olhos com uma mirada audaz e diz:

"Venho enfrentar meu destino. Toda minha vida foi posta ao revês com o desamparo de Pégasus... Falo coisas que ninguém entende e profetizo uma jornada que ninguém acredita... Sou valente, ó nobre Planta, e quero conhecimento para não hesitar em minha decisão de seguir viagem, de poder continuar o meu caminho..."

A Planta move suas raízes e galhos e começa a dizer.:

"És, deveras, jovem pequena..." - Antes de concluir a frase a menina interrompe a oração de Yggdrasill.:

"Não sou jovem! Tenho mais de 20 mil luas de idade..."

A Árvore solta uma gargalhada abafada produzindo um leve tremor no local e diz:

"Não importa quantas luas tens... Em verdade antes que ela fosse eu era, menina guerreira. - A Planta esboça um suspiro e prossegue - E contudo nunca esperaria encontrar-te aquí, porque conheço bem sua história e o que fostes capaz de construir em todos esses anos. Admiro a ti e aos teus pequena... Agora estende sua mão e escolha duas flores em meu galho... Escolha as que mais gosto tens e logo, se aceitas as regras, terás o que requisitas de mim."

Ato IV – O Reinício




Tanhya não teve dificuldades em escolher as duas flores. Arrancado-as do galho sustentou as duas nas mãos durante um tempo, até perceber que no local onde havia retirado as flores, Yggdrasill sangrava. A menina fitou a Árvore com espanto pois, não era sua intenção fazer-lhe mal algum. Abrindo a boca sem emitir sons a pequena seguia surpreendida pela ferida na Planta.

Não temas guerreira, há bons motivos nisso... Colhestes duas rosas brancas do meu galho e para fazê-lo tinhas que romper um vínculo que nos unia. Saiba que tudo que é separado por uma força estranha produz reações negativas e daninhas... ”

Então como pode haver bons motivos se as reações são daninhas? Não entendo... eu só lhe pedi orientação...”

Porque algumas vezes, há uniões que devem ser desfeitas para encaminhar e endireitar as coisas. Tens em suas mãos duas das minhas mais belas flores. E eu sei que lá de onde vens, em seu jardim, também possuis duas rosas, tão belas, como as minhas... E elas precisam do seu cuidado pequena, porque também sofrem sua ausência e as circunstâncias. Agora, vá a seu vilarejo e plante as sementes das minhas flores em seu jardim para que as suas rosas voltem a cobrar ânimo!

Quando o faças, gradativamente sua fala voltará a ser entendida e com a fragrância que será emanada por elas todos os outros habitantes de seu vilarejo passarão a compreender-te e compartir sua decisão. Mas recorde que essas mudanças não virão de um dia a outro e seu esforço se verá multiplicado por 10.”

A menina, segurando firme as duas rosas, fita Yggdrasill com esperança! Ela sentia a força da flores cruzando sua alma para empreender sua nova jornada. Com olhar contente e ansioso ela diz.:

E agora para lhe retribuir, qual seria o meu sacrifício?”

Deves eliminar-me. Corte todas minhas raízes com seu machado pequena, logo depois poderás seguir seu caminho e fazer tudo que lhe instruí...”

Mas como poderia eu fazer algo assim a ti? Fostes bom comigo...”

Minhas raízes absorveram a tristeza que levavas consigo e que impregnaram este local de solidão como podes observar ao redor. É necessário cortar também este vínculo de mim ou não resistirei muito aqui...”

As raízes de Yggdrasill pareciam não ter príncipio nem final. A menina sentiu medo pois levaria anos para cortar todas elas e assim poder voltar ao seu lar.(suas raízes não tem principio nem fim. Tenho medo. Posso levar anos para corta-las e então poder voltar à meu lar)

Escute pequena, a recompensa será melhor que o esforço que farás cortando minhas raízes. As duas rosas que tens em mãos lhe ajudarão a cumprir esse sacrifício... A menor delas lhe anunciará quando seu trabalho estiver terminado e lhe refrescará abundantemente com o orvalho do vale quando te sintas cansada... Ela deverá chamar-se Nadÿne.

A segunda rosa está repleta de compaixão e graça. Ela demonstrará empatia quando já não tenhas forças para seguir e tomará para si, algumas vezes, a responsabilidade. Ela deverá chamar-se Aïna."

Tanhya segura firme seu machado e com um olhar fixo começa a cortar as raízes de Yggdrasill. A Planta em momentos grita de dor, o que produz tristeza na jovem, mas ela continua o trabalho com apoio de suas duas companheiras.

Passam-se dias, semanas e meses até que a menina finalmente termina. Sua roupa e corpo estavam cheios de sangue da Planta e ela não havia percebido que a paisagem ao seu redor estava mudando a uma linda pradeira cheia de vida e animais radiantes de alegria! Olhando novamente para sua vestimenta, percebe que o sangue tinha se transformado em borboletas que rodeavam seu corpo em uma imagem belíssima.
A menina gira seus olhos para observar toda natureza e dá-se conta que estava de volta ao seu vilarejo sem apenas ter-se movido do local onde teve o encontro com a Velha Árvore. Seguindo as ordens de Yggdrasill ela coloca as sementes das flores que ganhou em seu jardim e passa a chamá-las pelos nomes que foi orientada.

Ainda emocionada por ver que as coisas aconteciam e se direcionavam como disse a Planta, Tanhya decide, finalmente, seguir o caminho que tanto ansiava e comentando-o com suas duas rosas ouve:

Mãezinha nós a amávamos e apoiamos tudo que seja feito e decidido para sua felicidade. Sentiremos sua falta aqui a nosso lado, mas também sabemos que apesar da distância nunca vais partir de verdade. Porque nosso coração estará unido para sempre e nenhuma força, por maior que seja, poderá desfazer essa união.”

E assim a jovem parte a sua nova aventura, sem saber que uma de suas rosas estava prestes a dar-lhe o fruto mais bonito de todo o jardim. Uma nova flor, chamada Gaël.



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